quinta-feira, 9 de julho de 2009

Todo o mundo e Ninguém

Entra Todo o Mundo, rico mercador, e faz que anda buscando alguma cousa que perdeu; e logo após, um homem, vestido como pobre. Este se chama Ninguém e diz:

Ning.: Que andas tu aí buscando?

T. Mundo: Mil cousas ando a buscar: delas não posso achar,
porém ando porfiando por quão bom é porfiar.


Ning.: Como hás nome, cavaleiro?

T. Mundo: Eu hei nome Todo o Mundo e meu tempo todo inteiro
sempre é buscar dinheiro
e sempre nisto me fundo.

Ning.: Eu hei nome Ninguém,
e busco a consciência.

Belzebu: Esta é boa experiência:
Dinato, escreve isto bem.

Dinato: Que escreverei, companheiro?

Belzebu: Que Ninguém busca consciência. e Todo o Mundo dinheiro.

Ning.: E agora que buscas lá?

T. Mundo: Busco honra muito grande.

Ning.: E eu virtude, que Deus mande que tope com ela já.

Belzebu: Outra adição nos acude: escreve logo aí, a fundo,
que busca honra Todo o Mundo e Ninguém busca virtude.

Ning.: Buscas outro mor bem qu'esse?

T. Mundo: Busco mais quem me louvasse tudo quanto eu fizesse.
Ning.: E eu quem me repreendesse em cada cousa que errasse.

Belzebu: Escreve mais.

Dinato: Que tens sabido?

Belzebu: Que quer em extremo grado Todo o Mundo ser louvado, e Ninguém ser repreendido.


TODO O MUNDO E NINGUÉM de Gil Vicente
bjosVôaliejavolto!

Nenhum comentário:

Postar um comentário